terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Carta Sem Título

Estamos chegando a mais um fim de ano, e o primeiro do blog, espero que agora de férias nós postemos mais e divulguemos um pouco mais também.
Bem, esse texto eu escrevi ontem (ou hoje, depende do ponto de vista) de madrugada. Estava no msn sem nada para fazer, como sempre, e me veio uma vontade inevitável de escrever, e foi isso que saiu.
Ao contrário de alguns poemas, esse é realmente o título do texto. Não o escrevi para ser uma carta, mas após relê-lo imaginei como se alguém estivesse lendo-o em um papel de carta, meio amarelado e antigo. É "Sem Título" pois a saudade não precisa ser nomeada, já é por si só saudade e compreensível, portanto, uma carta que fale sobre saudade também não precisa de título algum.
Espero que gostem. Abraços

Carta sem título (Ricardo José)

Tive uma vida bem simples ao teu lado, ainda me lembro das horas incertas que passei ouvindo sua voz, das tardes quentes que passávamos colados e dos invernos que passamos afastados. Às vezes ainda olho pela janela e me lembro de nós dois andando na areia, rindo da inevitabilidade do mar...

Vejo-me reparando incrédulo o solstício e procuro um sinal, um sinal de que o dia não seja mais longo, mas apenas mais doloroso, mais infinito na saudade ... Às vezes me pego olhando para o pôr do sol, vejo como o sol pinta as nuvens com um laranja vivo e preguiçoso, que se demora em cada espelho e se reflete em cada flor, que abre tantas rosas quanto as que fecha.

Ouço tantas músicas que na verdade não as ouço. Fico pensando em você e deixo a melodia formar o seu contorno, deixo a letra ser um rascunho da sua voz e permito-me esquecer de tudo em cada batida.

Tantos livros que li, e para quê? Nenhum deles contou minha história por inteiro, nenhum deles me serviu por inteiro, nenhum deles foi verdadeiro. Eram apenas histórias, rabiscos cegos marcados no meu pulso. Cada linha foi um parágrafo de meus pensamentos.

Passo tanto tempo pensando que às vezes acho que não penso em nada. É uma voz na minha cabeça que eu me reluto a ouvir. São palavras que não saem, são pássaros que não sabem voar.

Tudo que eu escrevo não passa de verdades mascaradas sobre mentiras. Quantos amores inventados para falar de uma paixão. Quantas dores que nunca senti, quantas conversas que não tive. Mas quantos beijos eu quis ... Quantas saudades senti ... Como desejei ter vivido muito do que li, ouvi, escrevi. Desejei muito ter vivido o que não fosse meu.

Saudade é algo que vem e fica, uma dor que, de tão grande, permite-se expor momentos de alegria. Inevitavelmente ela vem, e felizmente não se vai. Felizmente pois saudade é uma droga que vicia a memória a se lembrar das coisas boas, e em um mundo tão triste, nada de maior martírio do que fazer o coração sofrer para fazer o corpo sorrir.

Bem, meu amor, você se foi e não me importo mais. Não me importo pois revivo tudo o que fizemos e ainda vivo. Ainda sigo pelo parque vendo as flores caírem iluminadas e sorrio. Sorrio pois me lembro do teu riso. Ainda vejo o mar servir de sepulcro, ainda sinto o vento servir de calmante e ouço os pássaros ao fundo me lembrando quantos sons existem.

Mas nem sempre quero que sua ausência retorne. Como é ruim perceber que estou só às vezes. Como é ruim olhar a janela e ver a chuva fria escorrer nos meus olhos, salgada e infinda.

Mas hoje, a única tristeza que tenho é a de passar esta madrugada só, olhando o filme da madrugada contar nossas vidas, reparar que o cabelo da atriz me faz lembrar da tua segurança e voz. Não, tua companhia era do que eu mais precisava no momento em que você menos quis. Vou desligar a TV mas de nada adianta, não posso apagar o nosso mundo, não posso criar uma nova vida sem passado.

Na verdade não posso ter futuro. Não posso pois irei me apaixonar de novo, e esquecer parte de nosso mundo, e criar outro com novos erros, novos sorrisos, mas que no final, também acabará, e também deixará suas marcas impressas na minha boca e um frio apaixonado de ausência ...

3 comentários:

  1. O simples desejo de ter alguém que um dia já foi é o mesmo desejo de ler por um pedaço já lido, você lembra, mas você já leu e voltar atrás só mesmo para relembrar...

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  2. "O passado é passado" ... mas não devemos esquecê-lo, não podemos na verdade

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  3. Sempre devemos esquecê-lo, para continuar seguir em frente sim, porém o passado concerta erros que não iremo mais cometer no futuro, porque está lá para avisar, relembrar, ensinar.

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